A Fé que Não Salva: O Perigo de Crer Sem Cristo – 3

Origem e alvo da fé

Paulo escrevendo aos efésios, demonstra alguns aspectos de como a fé ocorre:

A fim de sermos para louvor da sua glória, nós, os que de antemão esperamos em Cristo; em quem também vós, depois que ouvistes (a)kou/w = “entender”, “atender”) a palavra da verdade, o evangelho da vossa salvação, tendo nele também crido, fostes selados com o Santo Espírito da promessa. (Ef 1.12-13).

A fé vem pelo ouvir do Evangelho (Rm 10.17) que Paulo chama aqui de “Evangelho da vossa salvação” (Ef 1.13). A Palavra de Deus é poderosa neste propósito determinado pelo próprio Senhor. Anunciar o Evangelho é anunciar a Cristo, não as nossas impressões ou percepções. O Evangelho é de Deus; não nos pertence. Posso compartilhar minhas intuições e reflexões. O Evangelho, no entanto, é para ser pregado.[1]

 

Fé centrada em Cristo

A fé salvadora, conforme revelada nas Escrituras, não é uma abstração religiosa ou uma disposição genérica de crer. Ela é, essencialmente, fé centrada em Cristo, o conteúdo vivo e eterno do Evangelho. Não se trata de uma fé na fé, mas de uma confiança pessoal e existencial no Senhor Jesus, conforme revelado na Palavra.[2]  O Evangelho não é um recipiente vazio que pode ser preenchido com qualquer conteúdo espiritual − ele é, por definição, a revelação do próprio Cristo, o Verbo encarnado. É uma revelação aberta de Deus”. [3] Desse modo, crer no Evangelho significa consentir com a mensagem revelada de Deus.[4]

O Evangelho não nos pertence. Ele pertence a Deus, o seu Autor e preservador. A Boa Nova é de Deus, cujo conteúdo é o próprio Deus anunciando a salvação para todos os que sinceramente a desejarem.[5] Portanto, o Evangelho tem como conteúdo e essência[6] a Jesus Cristo como Senhor e Salvador conforme revelado na Escritura. “Ter fé é crer que aquilo que Deus diz é verdade. O conteúdo da fé cristã é a Palavra revelada de Deus”, afirma MacArthur.[7] Jesus Cristo é a Palavra encarnada.

Fé é o abandono de toda confiança em obra produzida por nós mesmos como fundamento de nossa justificação e salvação. A fé está convencida intelectualmente de sua veracidade e incontestabilidade (Hb 11.1).[8] Além deste elemento intelectual, consiste em uma rendição incondicional ao seu Senhor, em quem descansa de forma amorosa e confiante.[9]

A fé ultrapassa a nossa capacidade racional, embora a envolva, bem como a sua demonstração lógica. Ou como diz, Mcgrath: “A fé não contradiz a razão, mas a transcende por meio de uma jubilosa libertação divina dos frios e austeros limites da razão e da lógica humanas”.[10]

A fé que não parte de um conhecimento verdadeiro e, por isso mesmo, não é vivencial, não é a verdadeira fé bíblica. A verdadeira fé manifesta-se em uma confiança existencial, a qual rege o nosso coração. A fé é persuadida pelo conhecimento que a possibilitou crer.[11] “A fé salvadora é um conhecimento seguro que produz segurança e certeza. Conhecimento e segurança caminham juntos”, interpreta Bavinck.[12]

É necessário que conheçamos o Senhor das Escrituras para que a nossa fé não se ampare em apenas uma invenção de nossa mente, num ser idealizado, uma projeção intelectual a respeito de Jesus, distante, portanto, da plenitude da revelação bíblica.

Quando Paulo e Barnabé chegam à Igreja de Antioquia, apresentam um relato sumário de seu trabalho. Eles desejam compartilhar com todos. Registra Lucas: “Ali chegados, reunida a igreja, relataram quantas coisas fizera Deus com eles e como abrira aos gentios a porta da fé” (At 14.27).

No seu testemunho, enfatizam o poder soberano e operante de Deus em seu ministério e, como Deus operou eficazmente chamando os seus pela fé. É por meio da Palavra que Deus nos gerou espiritualmente, tornando-nos seus filhos. De fato, o Espírito aplica em nós a salvação obtida por Cristo para o seu povo operando a fé em nós.

Quando Paulo se despede dos presbíteros de Éfeso, relata aspectos de seu ministério dos quais foram testemunhas. Diz então que durante aqueles 3 anos de pastorado entre eles, passou “testificando tanto a judeus como a gregos o arrependimento para com Deus e a fé em nosso Senhor Jesus Cristo” (At 20.21). Os efésios sabiam dessa realidade.

Essa fé, portanto, não nasce da iniciativa humana, nem se sustenta por méritos próprios. Ela é fruto da graça soberana de Deus, que nos alcançou.

 

Graça que ultrapassa nossa compreensão

A graça de Deus é algo que ultrapassa em muito a nossa capacidade de compreensão e, portanto, de explicação. Paulo demonstra que a nossa eleição contempla o louvor da graça de Deus:  “Para louvor da glória (do/ca) de sua graça, que ele nos concedeu gratuitamente no Amado” (Ef 1.6).

A glória de nossa salvação está no Deus da graça. É somente por esta gloriosa graça que somos o que somos e temos o que temos. A graça de Deus é a fonte de todas as bênçãos da vida cristã. (Ef 1.6-8).

Diante dessa graça incompreensível, somos naturalmente levados à doutrina que a expressa de forma mais clara: a justificação.

 

A Doutrina da Justificação pela Graça

A doutrina da justificação pela graça mediante a fé é o ponto capital onde se fundamenta a fé cristã e, consequentemente, a nossa relação com Deus.[13] Uma expressão inspirada nos escritos de Lutero (1483-1546), referindo-se à justificação, como “o artigo pelo qual a igreja se sustenta ou cai”, era comumente usada no século XVII por teólogos luteranos e reformados.[14]

A doutrina da justificação é a “artéria da graça”,[15] pela qual fluem os demais privilégios da vida cristã. Devemos deixar claro que o fundamento de nossa justificação não é a fé, mas a justiça de Cristo que é imputada a nós pela fé.[16] Diante da santidade e majestade de Deus quem, em sã consciência, honesta e sensatamente ousaria se considerar justo? E mais: O Deus santo não pode receber nem ter comunhão com um pecador.[17] Calvino ao tratar da justificação diz que a este tema “é o ponto principal sobre o qual a religião se sustém, razão pela qual devemos devotar a ele maior atenção e cuidado.”.[18]

O salmista, já sabendo a resposta, pergunta: “Se observares (rm;v’) (shamar), SENHOR, iniquidades, quem, Senhor, subsistirá?” (Sl 130.3). Ele não se ilude. Sabe que o escrutínio de Deus é perfeito. Quem passaria ileso? Quem pode dizer diante de Deus que não tem pecado?

Davi suplica: “Não entres em juízo com o teu servo, porque à tua vista não há justo nenhum vivente” (Sl 143.2).

Elifaz indaga: “Seria, porventura, o mortal justo diante de Deus? Seria, acaso, o homem puro diante do seu Criador? Eis que Deus não confia nos seus servos (anjos)[19] e aos seus anjos atribui imperfeições”[20] (Jó 4.17-18).

Há uma expressão que costumo usar − e talvez você também − que é: “passar os olhos”. Quando alguém me pede para ler determinado texto e, por algum motivo, não consigo fazê-lo com maior atenção, costumo dizer: “passei os olhos”. Ou seja, li rapidamente, talvez apenas alguns tópicos, sem me deter nos detalhes ou nas particularidades do conteúdo.

Por outro lado, o verbo (rm;v’) (shamar) de Deus (Sl 130.3), quando atribuído a Deus em textos como o Salmo 130.3, carrega um sentido muito mais profundo: significa “observar diligentemente”, “atentar verdadeiramente”, “prestar muita atenção”. Trata-se de uma observação rigorosa e criteriosa, voltada para a avaliação das faltas com vistas à prestação de contas. Vemos esse uso claramente em Jó: “Se eu pecar, tu me observas (rm;v’) (shamar);[21] (shamar); e da minha iniquidade não me perdoarás” (Jó 10.14).[22]

Esta é a situação do homem finito diante do Deus infinito: a sua grandeza e senso de perfeição e de justiça são como nada diante do Deus santo e perfeito. A grandeza de Deus revela a pequenez de nossas perspectivas. Moisés escreve: “Diante de ti puseste as nossas iniquidades e, sob a luz do teu rosto, os nossos pecados ocultos” (Sl 90.8).

Davi, consciente dos limites do seu próprio escrutínio, escreve: “Quem há que possa discernir (!yBi) (biyn) as próprias faltas (ha’ygIv.) (shegiy’ah)(= erros)? Absolve-me das que me são ocultas” (Sl 19.12). A palavra faltas (ha’ygIv.) (shegiy’ah) está geralmente associada aos pecados cometidos inconscientemente. Daí a dificuldade de discernir tais faltas.

Entretanto, a suposta ignorância não inocenta o infrator. O não ter percebido a indicação de contramão em determinada rua não invalida a possibilidade da multa caso seja flagrado ou, pior, de ter causado um grave acidente.

O conhecimento da Palavra de Deus aguça nossa sensibilidade espiritual. Por isso mesmo, adquirimos maior consciência de nossos pecados e, simultaneamente, reconhecemos as limitações do tribunal de nossa própria consciência.[23]

A consciência é um elemento significativo em meu progresso espiritual, embora não seja o juízo final.[24] Deus, sim, conhece-nos perfeitamente. Ele discerne com absoluta precisão quem somos e o que pensamos.

O salmista reconhece sua condição de pecador, mesmo quando peca involuntariamente. Ele sabe que Deus o sonda por completo. Contudo, está igualmente consciente de que seu Deus, além de onisciente, é santo − e seu padrão é a santidade perfeita.

Nossos pecados são sempre uma afronta à santidade de Deus. Eles exigem expiação. Mas como expiá-los de forma adequada e completa, se sou pecador e minha dívida parece crescer continuamente?[25]

Davi, consciente disso roga o perdão de Deus: Absolve-me (hq;n”) (naqah) (= tornar isento, ficar livre) das que me são ocultas (rt;s’) (cathar) (Sl 19.12). Ele recorre a Deus porque somente ele pode perdoar nossas faltas.[26]

Como então, Deus pode nos considerar justos, sendo ele Santo? Como pode o homem pecador tornar-se justo aos olhos de Deus? Deus diminuiu o seu padrão legal?[27]

Calvino (1509-1564) oferece uma resposta profunda e precisa à condição do homem diante da santidade de Deus. Em sua teologia, ele reconhece a distância abismal entre a natureza humana decaída e a perfeição divina. Para ilustrar essa realidade, apresento duas citações mais extensas que expressam com clareza sua perspectiva:

Lemos que justificado diante de Deus é aquele que, ao juízo de Deus, não só é considerado justo, mas que também foi aceito em razão de sua justiça, porque, como a iniquidade é abominável à vista de Deus, assim o pecador não pode achar graça a seus olhos, na qualidade de pecador e por quanto tempo for tido como tal. Consequentemente, onde quer que haja pecado, aí também se manifesta a ira e vingança de Deus. Portanto, justificado é aquele que não é tido na conta de pecador, mas de justo, e por esse título se posta firme diante do tribunal de Deus, onde todos os pecadores se prostram abatidos. Da mesma forma, se um inocente acusado for levado perante o tribunal de um juiz imparcial, depois de ser julgado segundo sua inocência, se diz que foi justificado diante do juiz; assim é justificado diante de Deus aquele que, excluído do número dos pecadores, tem a Deus por testemunha e arauto de sua justiça. (…) Será justificado pela fé aquele que, excluído da justiça das obras, apreende pela fé a justiça de Cristo, revestido da qual aparece perante Deus não como pecador, mas, pelo contrário, como justo. Portanto, interpretamos a justificação simplesmente como a aceitação mercê da qual, recebidos à sua graça, Deus nos tem por justos. E dizemos que ela consiste na remissão dos pecados e na imputação da justiça de Cristo.[28]

Daqui se conclui também isto: unicamente pela intercessão da justiça de Cristo é que logramos ser justificados diante de Deus. Isso equivale exatamente se fosse dito que o homem não é inerentemente justo; pelo contrário, visto que a justiça de Cristo se comunica com ele por imputação, o que é digno de acurada consideração. Porque desse modo se desvanece aquela fútil fantasia, segundo a qual o homem é justificado pela fé enquanto por ela recebe o Espírito de Deus, com o qual é feito justo. Isto é tão contrário à doutrina exposta, que jamais poderá estar de acordo com ela.  Ora, sem sombra de dúvida, que quem deve buscar a justiça fora de si mesmo se encontra desnudo de sua própria justiça.  (…) [2Co 5.21]. Vês que nossa justiça não está em nós, mas em Cristo; que entramos na posse desse direito somente porque somos participantes de Cristo, pois que com ele possuímos todas as suas riquezas. (…)  Pois, mercê desse direito, Cristo, o Senhor, compartilha conosco sua justiça, de sorte que, no que concerne ao juízo de Deus, de certa maneira maravilhosa ele transmite seu poder.[29]

Do mesmo modo Turretini (1623-1687): “É deveras uma abominação a Yahweh justificar o ímpio sem uma devida satisfação, porém Deus, neste sentido, não justifica nenhum ímpio (Cristo foi dado como o fiador que recebeu em si a punição que nos era merecida).”[30]

 

Pacto das Obras de Cristo

Certamente, não podemos trivializar o perdão de Deus. Embora seja gratuito para nós, custou o sangue precioso de seu Filho. O perdão divino não é barato − é profundamente valioso e sacrificial.[31] A graça de Deus não é barata.[32]

A graça de Deus se evidencia nas obras da Trindade. O Pacto da Graça,[33]  por meio do qual somos salvos, foi Pacto de Obras para Cristo.[34] A nossa salvação é muito cara, custou o precioso sangue de Cristo (1Pe 1.18-20/At 20.28; 1Co 6.20).[35]

Calvino comenta:     “Cristo foi o preço de ‘nosso castigo’, isto é, do castigo que nos era devido. Assim a ira de Deus, que foi justamente inflamada contra nós, foi apaziguada e através do Mediador obtivemos ‘paz’ pela qual somos reconciliados.”[36]

Perdoar, nesse contexto, significa considerar o devedor como alguém que jamais ofendeu. É não lhe imputar qualquer dívida. Após o perdão, o devedor deixa de sê-lo; torna-se simplesmente uma pessoa, sem qualquer adjetivo que o relacione à ofensa. Tanto o pecado quanto o perdão já não são mais contabilizados. Com o perdão de Deus, o relacionamento é restaurado − não há mais barreiras, nem lembrança da culpa.

Longe de minimizar o pecado ou sua gravidade, o perdão de Deus exalta sua misericórdia.[37] Ele não ignora a ofensa, mas a cobre com graça, revelando a profundidade do seu amor e a beleza da reconciliação.

A Palavra de Deus nos diz que todos pecaram (Rm 3.23). Por outro lado, temos no Novo Testamento a declaração explícita que vale para todas as épocas. que em Cristo Jesus somos justificados, sendo perdoados de todos os nossos pecados.[38]

O perdão é um favor de Deus, uma prerrogativa sua, não algo a que temos direito por nossos merecimentos. Daniel, diz: “Ao Senhor, nosso Deus, pertence a misericórdia e o perdão” (Dn 9.9/Sl 130.4).

Grider (1921-2006) nos chama a atenção para o fato de que “nenhum livro de religião, a não ser a Bíblia, ensina que Deus perdoa completamente o pecado”.[39]

No Novo Testamento, Paulo estabelece um contraste entre a “graça” e as “obras”: “E, se é pela graça, já não é pelas obras; do contrário, a graça já não é graça” (Rm 11.6). “Méritos humanos estão excluídos de todo o plano da salvação”, enfatiza Plumer (1802-1880).[40]

            “Deus (…) é rico em perdoar” (Is 55.7). Portanto, “Bem-aventurado o homem a quem o SENHOR não atribui iniquidade e em cujo espírito não há dolo” (Sl 32.2).

 

Rev. Hermisten Maia Pereira da Costa

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[1]“O Evangelho não é algo inventado pelas percepções dos profetas ou pregadores, mas esse Evangelho vem do próprio Deus. Ele o possui. É sua propriedade. Portanto, quando proclamamos o Evangelho, estamos proclamando uma mensagem que não é nossa” (R.C. Sproul, O Pregador Mestre: In: R. Albert Mohler, Jr., et. al. Apascenta o meu rebanho: um apaixonado apelo em favor da pregação, São Paulo: Cultura Cristã, 2009, p. 95). Deparei-me com uma compreensão semelhante à minha: “Não somos chamados a ‘compartilhar’ a Palavra e certamente não fomos chamados a fazer ‘parte do discurso’ sobre a Palavra. Somos chamados a proclamar a Palavra e para fazer isso com autoridade” (Tom Pennington, Pregando no poder do Espírito: In: John, MacArthur, ed. O Pastor como Pregador. Eusébio, CE.: Editora Peregrino, 2016, [p.  147-163], p. 151).

[2]“O conteúdo do Evangelho é Jesus mesmo, não um credo ou uma doutrina ou teoria acerca Dele” (Alan Richardson, Así se hicieron los Credos: Una breve introducción a la historia de la Doctrina Cristiana, Barcelona: Editorial CLIE, 1999, p. 17). “Para os Cristãos, Jesus é a personificação e a autorrevelação de Deus. No cerne da fé cristã está uma pessoa viva, não um livro” (Alister E. McGrath, Paixão pela Verdade: a coerência intelectual do Evangelicalismo, São Paulo: Shedd Publicações, 2007, p. 33).

[3]Veja-se: João Calvino, Exposição de Segundo Coríntios, São Paulo: Paracletos, 1995, (2Co 3.18), p. 78.

[4] Veja-se: João Calvino, O Evangelho segundo João, São José dos Campos, SP.: Editora Fiel, 2015, v. 1, (Jo 3.32), p. 147.

[5]“Elimine-se o evangelho, e todos permaneceremos malditos e mortos à vista de Deus. Esta mesma Palavra, por meio da qual somos gerados, passa a ser leite para nos criar, bem como alimento sólido para a nossa nutrição contínua” (João Calvino, Exposição de 1 Coríntios, São Paulo: Paracletos, 1996, (1Co 4.15), p. 143).

[6]“Cristo é o fim da lei e a suma do Evangelho” (João Calvino, Efésios, São Paulo: Paracletos, 1998, (Ef 2.20), p. 78).

[7]John MacArthur, Deus: Face a face com sua majestade, São José dos Campos, SP.: Fiel, 2013, p. 16.

[8]“Ora, a fé é a certeza de coisas que se esperam, a convicção de fatos que se não veem” (Hb 11.1).

[9]Para uma descrição sumária deste ponto, entre outros, vejam-se: R.C. Sproul, O Que é teologia Reformada, São Paulo: Cultura Cristã, 2009, p. 59-60; L. Berkhof, Teologia Sistemática, Campinas, SP.: Luz para o Caminho, 1990, p. 506-508; Hermisten M.P. Costa, Eu Creio, São Paulo: Paracletos, 2002, p. 103-104; Abraham Kuyper, A Obra do Espírito Santo, São Paulo: Cultura Cristã, 2010, p. 409-412. Para uma abordagem histórico-crítica um pouco mais ampla, veja-se: Herman Bavinck, Dogmática Reformada, São Paulo: Cultura Cristã, 2012, v. 4, p. 128-135; 212-215.

[10]Alister E. McGrath, Surpreendido pelo sentido: ciência, fé e o sentido das coisas, São Paulo: Hagnos, 2015, p. 15.

[11]Veja-se: Abraham Kuyper, A Obra do Espírito Santo, São Paulo: Cultura Cristã, 2010, p. 412.

[12]Herman Bavinck, Dogmática Reformada, São Paulo: Cultura Cristã, 2012, v. 4, p. 99. Veja-se: Alister E. McGrath, Surpreendido pelo sentido: ciência, fé e o sentido das coisas, São Paulo: Hagnos, 2015, p. 14-15.

[13] Veja-se: João Calvino, As Institutas, 3. ed. São Paulo: Cultura Cristã, 2002, III.11.1. Turretini diz que ela é “a principal plataforma da religião cristã” (François Turretini, Compêndio de Teologia Apologética, São Paulo: Cultura Cristã, 2011, v. 2, p. 757). “A doutrina da justificação pela graça é o âmago da fé cristã” (Franklin Ferreira; Alan Myatt, Teologia Sistemática, São Paulo: Vida Nova, 2007, p. 812). “…. é a própria estrutura e o pilar do cristianismo. Um erro sobre a justificação é algo perigoso, como um defeito em uma fundação. A justificação dada por Cristo é a fonte da água da vida” (Thomas Watson, A Fé Cristã, estudos baseados no breve catecismo de Westminster, São Paulo: Cultura Cristã, 2009, p. 264).

[14]Em 1677, Owen (1616-1683)  escreveu: “Em minha opinião, Lutero falou a verdade quando disse: “Amisso articulo justificationis, simul amissa est tota doctrina Christiana”. E eu gostaria que ele não tivesse sido um profeta verdadeiro, quando predisse que nas eras seguintes sua doutrina seria novamente obscurecida….” (John Owen,  The Doctrine of Justification by faith, p. 67: In: https://ccel.org/ccel/owen/just/just.iv.viii.html  (Consulta feita em 16.10.2025). Vejam-se: Alister E. McGrath, Lutero e a Teologia da Cruz, São Paulo: Cultura Cristã, 2015, p. 41-42; W. Robert Godfrey, Calvino e o Concílio de Trento: In: Michael Horton, org. Cristo o Senhor: A Reforma e o Senhorio da Salvação, São Paulo: Editora Cultura Cristã, 2000, [p. 115-125], p. 115. Fazendo eco a esta expressão, mais tarde escreveria Bavinck: “A justificação é a doutrina sobre a qual a igreja fica de pé ou cai. Ou devemos fazer alguma coisa para sermos salvos ou nossa salvação é puramente um dom da graça. Deus não coloca de lado a lei que nos julga adequadamente; somente porque Cristo suportou a ira de Deus nós somos reconhecidos como justos nele” (Herman Bavinck, Dogmática Reformada, São Paulo: Cultura Cristã, 2012, v. 4, p. 180-181). (Do mesmo modo: John Murray, Redenção: Consumada e Aplicada, São Paulo: Cultura Cristã, 1993, p. 136).

[15] Devo esta expressão a Kuyper (Abraham Kuyper, A Obra do Espírito Santo, São Paulo: Cultura Cristã, 2010, p. 329).

[16]“A fé não é a base da justificação; se o fosse, a fé tornar-se-ia uma obra meritória. (…) De acordo com Paulo, não é sobre a nossa fé, mas sobre a retidão de Cristo, que a nossa justificação está alicerçada” (J.I. Packer, Vocábulos de Deus, São José dos Campos, SP. Fiel, 1994, p. 130,131). Vejam-se: François Turretini, Compêndio de Teologia Apologética, São Paulo: Cultura Cristã, 2011, v. 2, p. 773-776; Herman Bavinck, Dogmática Reformada, São Paulo: Cultura Cristã, 2012, v. 4, p. 217ss.; p. 266.

[17]Veja-se: Thomas Watson, A Fé Cristã, estudos baseados no breve catecismo de Westminster, São Paulo: Cultura Cristã, 2009, p. 266.

[18] João Calvino, As Institutas, III.11.1.

[19] Aqui não indica o pecado dos anjos; antes, que Deus realiza as suas próprias tarefas essenciais.

[20]BJ: “Verbera o erro”; ACR: “Atribui loucura”. “O significado da palavra traduzida imperfeições no v. 18b, que ocorre somente aqui, é totalmente desconhecido, e tem dado origem a muitas conjecturas e emendas” (Francis I. Anderson, Jó: Introdução e Comentário, São Paulo: Mundo Cristão; Vida Nova, 1984, (Jó 4.18), p. 112).

[21]Vejam-se: Hermann J. Austel, Shama’: In: R. Laird Harris, et. al., eds. Dicionário Internacional de Teologia do Antigo Testamento, São Paulo: Vida Nova, 1998, p. 1585-1587; Keith N. Schoville, Smr: In: Willem A. VanGemeren, org. Novo Dicionário Internacional de Teologia e Exegese do Antigo Testamento, São Paulo: Cultura Cristã, 2011, v. 4, p. 181-183.

[22] Do mesmo modo: “Ainda que eu seja justo, a minha boca me condenará; embora seja eu íntegro, ele me terá por culpado” (Jó 9.20). “….observas (rm;v’) (shamar) todos os meus caminhos e traças limites à planta dos meus pés” (Jó 13.27).

[23] “Faríamos bem em relembrar que, fazendo de nosso conhecimento e de nossa consciência miseravelmente imperfeitos e a medida de nossa pecaminosidade, estamos pisando em terreno perigoso” (J.C. Ryle, Santidade, São José dos Campos, SP.: Editora Fiel, 1987, p. 23).

[24]“A consciência não é um tribunal celestial, porém é o mais elevado tribunal terreno, pois é o sistema de alerta da alma” (John MacArthur, Certezas que impulsionam um ministério duradouro: In: John Piper; Justin Taylor, eds. Firmes: um chamado à perseverança dos santos, São José dos Campos, SP.: Editora Fiel, 2010, p. 70).

[25]“Somos devedores de Deus. Não lhe devemos algo, nem pouco nem muito senão pura e simplesmente         tudo: nossa pessoa em sua totalidade, a nós mesmos como criatura que somos, sustentadas e nutridas por sua bondade. (…) Porque ainda que vivendo como cristãos, vamos aumentando sem cessar nossa dívida e agravando a embrulhada da nossa situação. A dívida cresce de dia em dia. E imagino que à medida que envelhecemos, mais conta nos damos de que não temos possibilidade alguma de cancelar essa dívida. As coisas vão de mal a pior”. conclui Barth (1886-1968). (K. Barth, La Oración,  Buenos Aires: La Aurora, 1968, p. 75,76).

[26]O verbo está no piel. Neste modo, sempre Deus é o sujeito da ação. (Veja-se: Milton C. Fisher; Bruce K. Waltke, Nãqâ: In: R. Laird Harris, et. al., eds. Dicionário Internacional de Teologia do Antigo Testamento, São Paulo: Vida Nova, 1998, p. 998.

[27] Deus é essencialmente santo, assim como é justo, bondoso e poderoso. Sua santidade é absoluta, necessária e inseparável de seu próprio ser. Mais do que um atributo entre outros, a santidade é a qualidade que permeia e qualifica todos os aspectos de Deus. Tudo nele é santo: seu amor, sua justiça, sua misericórdia − até mesmo sua ira.

A santidade é a beleza que harmoniza perfeitamente o ser de Deus com seus atos. Ele age sempre em conformidade com sua natureza santa, sem qualquer contradição ou perda de perfeição. Não há dissonância entre o que Deus é e o que Ele faz; sua ação é sempre expressão fiel de sua essência.

Na literatura hebraica, a repetição de palavras é um recurso para enfatizar conceitos fundamentais. Por isso, na visão do profeta Isaías, os serafins proclamam com júbilo: “Santo, santo, santo é o SENHOR dos Exércitos; toda a terra está cheia da sua glória” (Is 6.3). Nenhum outro atributo divino é exaltado dessa forma − apenas a santidade recebe essa ênfase tripla, indicando sua supremacia.

Toda santidade é relacional e derivada de Deus. Por isso, afirmamos que a santidade nas Escrituras é teorreferente: ela aponta para Deus como sua fonte única e absoluta. Somente Ele pode santificar, pois somente Ele é plenamente santo (Ex 31.13; Lv 20.8; 21.8,15,23; 22.9,16,32; Ez 20.12; 37.28).

A santidade de Deus envolve separação daquilo que é comum e manifestação de glória, mas não exclui o aspecto relacional de sua revelação. Ao mesmo tempo em que é transcendente, Deus se revela de forma santa ao ser humano, convidando-o à comunhão e à transformação.

[28] João Calvino, As Institutas, III.11.2.

[29] João Calvino, As Institutas, III.11.23.

[30]François Turretini, Compêndio de Teologia Apologética, São Paulo: Cultura Cristã, 2011, v. 2, p. 761.

[31]“Nós dizemos que [a Redenção] é gratuita para nós, mas não para Cristo, a quem custou altíssimo preço, uma vez que Ele pagou o resgate com o seu santo e precioso sangue, porque não existe nenhum outro preço que possa satisfazer à justiça de Deus.” (João Calvino, As Institutas da Religião Cristã: edição especial com notas para estudo e pesquisa, São Paulo: Cultura Cristã, 2006, v. 2, (II.6), p. 237).       Booth (1734-1806) escrevendo sobre este assunto, assim se expressou:

“A graça de Deus está fundamentada na obediência perfeita e meritória de Cristo” (A. Booth, Somente pela Graça, São Paulo: Publicações Evangélicas Selecionadas, 1986, p. 15).

“Ainda que este perdão seja gratuito para os pecadores, nunca devemos nos esquecer de que Cristo pagou um alto preço por ele. Perdão para a menor das nossas ofensas só se tornou possível porque Cristo cumpriu as mais aflitivas condições – Sua encarnação, Sua perfeita obediência à lei divina e Sua morte na cruz. O perdão que é absolutamente gratuito ao pecador teve um alto custo para o Salvador” (A. Booth, Somente pela Graça, p. 31).

“A graça de Deus vem a nós não porque Deus revela o fato da Sua lei ser quebrada por nós, mas porque a Sua lei foi plenamente satisfeita pelos atos de justiça que Cristo fez a nosso favor. (…) Ele cumpriu perfeitamente a lei de Deus” (A. Booth, Somente pela Graça, p. 56-57).  Vejam-se:  João Calvino,   Harmonia dos Evangelhos (Volumes 1, 2 e 3) [Mt 27.46], (Portuguese Edition) (p. 1406,1408). Edição do Kindle; J.I. Packer, O Conhecimento de Deus, São Paulo: Mundo Cristão, 1980, p. 121.

[32]Posteriormente li MacArthur comentando a respeito da expressão “graça barata” (Veja-se: John MacArthur, O Evangelho Segundo os Apóstolos, São José dos Campos, SP.: Editora Fiel, 2011, p. 68-90). Dentro de uma perspectiva complementar, escreveu Bonhoeffer (1906-1945): “A graça barata é inimiga mortal de nossa igreja. A nossa luta trava-se hoje em torno da graça preciosa. Graça barata é graça como refugo, perdão malbaratado, consolo malbaratado, sacramento malbaratado; é graça como inesgotável tesouro da Igreja, distribuído diariamente com mãos prontas, sem pensar e sem limites; a graça sem preço, sem custo. (…) A graça barata é, por isso, uma negação da Palavra viva de Deus, negação da encarnação do Verbo de Deus. (…) A graça barata é a pregação do perdão sem arrependimento, é o batismo sem a disciplina de uma congregação, é a Ceia do Senhor sem confissão dos pecados, é absolvição sem confissão pessoal. A graça barata é a graça sem discipulado, a graça sem a cruz, a graça sem Jesus vivo, encarnado” (D. Bonhoeffer, Discipulado, 2. ed. São Leopoldo, RS.: Sinodal, 1984, p. 9-10). Do mesmo modo: “A graça de Deus não é graça barata; ela custa tudo que somos e que temos” (Helmut Thielicke, Mosaico de Deus, São Leopoldo, RS.: Sinodal, 1968, p. 72). “Onde o pecado não é encarado como pecado, a graça não pode ser graça. Que necessidade de expiação poderiam ter homens e mulheres quando lhes é dito que o seu problema mais profundo é algo menos do que aquilo que a Bíblia ensina explicitamente? O ensino fraco sobre o pecado leva à graça barata e não conduz ao evangelho” (Albert Mohler Jr., O desaparecimento de Deus, São Paulo: Cultura Cristã, 2010, p. 32).

[33]“Cristo amou a esta linhagem desde antes da fundação do mundo. É um pensamento nobre e glorioso – o mesmo lirismo da doutrina calvinista, a qual nós ensinamos – que antes que a estrela matutina conhecesse seu lugar, antes que do nada Deus criasse o universo, antes que a asa do anjo agitasse os virgens espaços etéreos, e antes que um solitário cântico perturbasse o silêncio no qual Deus reinava supremamente. Ele já havia entrado em conselho consigo mesmo, com Seu Filho e com Seu Espírito, e havia determinado, proposto e predestinado a salvação de Seu povo” (C.H. Spurgeon,  Sermões no Ano do Avivamento, São Paulo: Publicações Evangélicas Selecionadas, 1994, p. 47-48).

[34]“Em última análise a justificação é por obras no sentido que somos justificados pelas obras de Cristo” (R.C. Sproul, O Que é teologia Reformada, São Paulo: Cultura Cristã, 2009, p. 61).

[35]18 Sabendo que não foi mediante coisas corruptíveis, como prata ou ouro, que fostes resgatados do vosso fútil procedimento que vossos pais vos legaram, 19 mas pelo precioso sangue, como de cordeiro sem defeito e sem mácula, o sangue de Cristo, 20 conhecido, com efeito, antes da fundação do mundo, porém manifestado no fim dos tempos, por amor de vós” (1Pe 1.18-20).

[36]John Calvin, Commentary on the Book of the Prophet Isaiah, Grand Rapids, Michigan: Baker Book House Company, (Calvin’s  Commentaries), 1996 (Reprinted), v. 8/4, (Is 53.5), p. 116.

[37] “Eu, eu mesmo, sou o que apago as tuas transgressões por amor de mim, e dos teus pecados não me lembro” (Is 43.25). “Desfaço as tuas transgressões como a névoa, e os teus pecados como a nuvem; torna-te para mim, porque eu te remi” (Is 44.22). “Quem, ó Deus, é semelhante a ti, que perdoas a iniquidade, e te esqueces da transgressão do restante da tua herança? O Senhor não retém a sua ira para sempre, porque tem prazer na misericórdia. Tornará a ter compaixão de nós; pisará aos pés as nossas iniquidades, e lançará todos os nossos pecados nas profundezas do mar” (Mq 7.18-19). “….Perdoarei as suas iniquidades, e dos seus pecados jamais me lembrarei” (Jr 31.34). (Vejam-se: Is 55.7; Jr 5.1; 33.8; Ez 36.25).

[38] “Se Deus perdoasse o pecado sem contudo ministrar sua justiça, deixaria de ser Deus. A maravilha deste plano é que Deus, ao colocar os nossos pecados sobre Cristo e ao tratar deles punindo-os em Cristo, pode perdoar-nos e ainda ser justo. Ele puniu o pecado, não o esqueceu, não o ignorou” (D.M Lloyd-Jones, Salvos desde a Eternidade, São Paulo: Publicações Evangélicas Selecionadas, 2005 (Certeza Espiritual: v. 1), p. 53).

[39] J.K. Grider, Perdão: In: Walter A. Elwell, ed. Enciclopédia Histórico-Teológica da Igreja Cristã, São Paulo: Vida Nova, 1990, v. 3, p. 136. Esta declaração não entra em conflito com o fato de que os deuses dos povos do Antigo Testamento eram aplacados em sua ira e esta consciência de “perdão” era testemunhada pelos seus adoradores. (Cf. J. Scharbert, Perdão: In: Heinrich Fries, (dir.). Dicionário de Teologia, 2. ed. São Paulo: Loyola, 1987, v. 4, [p. 229-238], p. 229-230). Contudo, um exemplo explícito de um “deus” declarando o perdão absoluto parece ser estranho à literatura antiga, fora da Bíblia.

[40] William S. Plumer, Psalms, Carlisle: The Banner of Truth Trust, 1978, (Reprinted), (Sl 130.4), p. 1125.