Objeções à doutrina da eleição soberana de Deus
Por John G. Reisinger
Esta edição de Sound of Grace lida com alguns dos argumentos usados por aqueles que discordam com a visão histórica de que a Bíblia fala sobre “eleição”. Uma das objeções mais comuns é algo parecido com isso:
“Eu concordo de coração que Deus ‘escolhe algumas pessoas para serem salvas’. Entretanto, Sua escolha é baseada inteiramente em Sua presciência. Como Deus vê o futuro e ‘prevê’ todas as coisas que acontecerão, Ele claramente pré-conhece aqueles que desejarão aceitar Jesus quando a oportunidade for apresentada. Deus, com base nessa ‘presciência’ (conhecimento prévio), escolhe aqueles que Ele ‘prevê’ que aceitarão a Cristo por seu próprio livre-arbítrio”.
Não é necessário pensar muito para ver que esta ideia nega completamente que Deus, no sentido que for, soberanamente escolhe homens para salvação. De forma simples, uma visão como esta, na verdade, diz o seguinte:
(1) O homem precisa estar desejando, por si próprio, aceitar a Cristo.
(2) Deus observa o futuro e vê quais pessoas desejarão que “Cristo as salve”
(3) Deus decide escolher todos estes que primeiro O escolheram.
(4) A graça eletiva de Deus é totalmente “condicionada” pelo desejo humano de ser salvo.
(5) Nossa eleição para a salvação não é baseada na soberania de Deus mas na soberania e poder do “livre-arbítrio” do homem.
Em nenhum sentido podemos dizer que Deus “escolheu” alguém se seguirmos este esquema. No final, Deus meramente ratifica a escolha do homem. Deus não pode ou é capaz de escolher “quem Ele desejar”. Deus só pode esperar que Ele “preveja” no futuro algumas pessoas que decidirão, por seu livre arbítrio, aceitar a Cristo. Esta visão é muito simpática às ingênuas ideias humanas sobre sua total autonomia e à força toda-poderosa de seu “livre-arbítrio”. Entretanto, é uma distorção grosseira do que a Bíblia ensina claramente sobre o assunto da eleição.
Pela visão acima, a “presciência” de Deus é uma grande coberta usada pelos homens para “limpar” e esconder a verdade da soberana graça eletiva de Deus. Entretanto, isto deixa um grande e terrível buraco na coberta. Como esta edição de Sound of Grace nos mostra em diferentes artigos, a “presciência de Deus” é um ato divino e não apenas um mero atributo. É algo que Deus faz, não algo que ele “sabe de antemão”. Presciência de Deus é realmente Seu prévio amor ou prévia escolha de Seu povo. No entanto, é melhor definido com “a prévia escolha de Deus, baseada em seu amor prévio”.
Não iremos repetir aqui o que foi claramente exposto na edição impressa. Entretanto, eu gostaria de discutir diversas passagens-chaves que falam da “presciência” de Deus. Um dos textos que são usados em tentativas inúteis de provar que a escolha de Deus é fundamentada em seu pré-conhecimento da inclinação do homem é Romanos 8:29. No entanto, esse texto não está falando sobre o que Deus sabe (informação prévia) mas quem (indivíduos) Ele conheceu de antemão. O texto em nenhum lugar sugere que Deus “conheceu de antemão aqueles que desejariam crer”. Uma ideia como esta não pode ser encontrada em qualquer lugar neste versículo. O texto diz “aqueles que [Deus] de antemão conheceu” e nunca menciona ou implica alguma coisa sobre um suposto desejo do homem de ser escolhido. Observe a passagem:
“Pois AQUELES que de antemão conheceu, também os predestinou para serem conformes à imagem de seu Filho, a fim de que ele seja o primogênito entre muitos irmãos.” (Romanos 8:29)
O contexto inteiro deste trecho de Romanos 8 está defendendo a posição teológica que dá ao crente a segurança de que Deus ao mesmo tempo deseja e é capaz de cumprir a grande promessa dada em Romanos 8:28. Como nós podemos ter certeza que todas as coisas, sem a mínima exceção, irão positivamente “cooperar para o bem” do povo de Deus? O verso 29 até o final do capítulo são a resposta a esta questão. Rm 8:29 continua com a palavra “porque”, seguindo a verdade descrita no versículo 28. O argumento prossegue provando porque tudo prometido no versículo 28 deve trabalhar para o bem de todos os filhos de Deus. Paulo menciona cinco pontos que caminham juntos como elos em uma corrente. Cada um dos cinco elos está integralmente conectado ao elo que o precede e ao que se segue. Observe esses elos nos seguintes versículos:
“Porque OS QUE dantes
(1) conheceu, também OS
(2) predestinou para serem conformes à imagem de seu Filho, a fim de que ele seja o primogênito entre muitos irmãos; e AOS QUE predestinou, a ESTES também
(3) chamou; e AOS QUE chamou, a ESTES também
(4) justificou; e AOS QUE justificou, a ESTES também
(5) glorificou.” (Rm 8:29,30)
É fácil perceber que estes cinco pontos mencionados nos versículos são verdades para todos os crentes, sem exceção. Porém, é essencial para nós ver que esses cinco elos são somente para crentes, e somente verdades porque eles são os eleitos. A causa de nenhuma dessas coisas pode ser atribuída ao livre-arbítrio do homem. O “AOS QUE”, em todos os casos, é sinônimo de “ESTES” no próximo elo da corrente. Há um povo (os eleitos) em questão e todos os cinco elos da corrente são verdadeiros para cada indivíduo deste grupo de pessoas. Todos os crentes foram:
(1) “conhecidos” por Deus (vs. 29)
(2) “predestinados” por Deus (vs. 29)
(3) “chamados” por Deus (vs. 30)
(4) “justificados” por Deus (vs. 30)
(5) “glorificados” por Deus (vs. 30)
De acordo com a Bíblia, todos aqueles que Deus de antemão conheceu (vs. 29), também foram predestinados por Ele (vs. 29) para serem conformes à imagem de Cristo. Todos aqueles que Ele predestinou, a estes Deus também chamou (vs. 30). Note que todos aqueles, sem exceção, que foram predestinados também são, sem exceção, chamados assim como todos, sem exceção, que foram conhecidos de antemão também foram predestinados. Todos os elos formam uma corrente do singelo propósito divino de graça para Seu rebanho. Deveria ser óbvio que os versículos claramente estabelecem os seguintes fatos:
UM: É impossível fazer os versos dizerem que Deus primeiro chama todos os homens e então predestina aquelas que Ele “prevê” que estão desejando ter fé. O texto diz que nosso chamado nasce da predestinação. Nós fomos predestinados antes de ser chamados, e nós fomos chamados somente porque fomos primeiramente predestinados. O texto é claro. Nós somos chamados primeiramente porque fomos conhecidos de antemão e predestinados. O arminiano inverte a ordem clara do texto. Ele faz o efeito ser a causa, distorce e confunde o que Paulo está dizendo.
DOIS: Todos os predestinados, e apenas os predestinados, são chamados, e eles são chamados somente porque Deus primeiramente os pré-conheceu (amou de antemão) e os predestinou. Eu repito – a Bíblia é clara como cristal se nós apenas deixamos a Escritura significar o que ela diz.
TRÊS: Os “chamados” no verso 30 são as mesmas pessoas que foram ditas “chamados” no verso 28. Somos chamados “segundo Seu propósito” e este propósito é nos conformar à imagem de Cristo. O primeiro passo que Deus toma para alcançar este propósito é chamar-nos da morte para a vida, ao regenerar nossos corações mortos e nos conceder fé para crer no evangelho. “Chamado” nestes versículos não pode ser nada menos que um chamado ou regeneração eficazes.
QUATRO: A promessa do versículo 28 é para todos os que “amam a Deus”, ou aqueles “chamados segundo Seu propósito”. Paulo está descrevendo as mesmas pessoas de duas maneiras diferentes. Quem ousaria dizer que a razão pela qual somos predestinados para sermos conformes a imagem de Jesus é porque “amamos a Deus”? Não, meu amigo, nós amamos a Deus somente porque nós fomos amados primeiro por Ele na graça eletiva. Nós fomos então predestinados por causa deste amor. Olhe cuidadosamente ao argumento nos textos. Aqueles que foram predestinados são aqueles que foram previamente conhecidos ou amados por Deus. Aqueles que “amam a Deus” são aqueles que primeiro foram amados e escolhidos por Ele em sua soberana graça. “Livre-arbítrio” não pode ser enfiado no contexto com um martelo. Todos os elos nesta corrente foram ligados durante a eternidade na forja da graça soberana. Nada nesta corrente depende de elos fracos feitos pelo desejo errático e pecaminoso do homem.
Vamos continuar com o argumento de Paulo neste texto de Romanos 8. Nós estamos no terceiro elo, chamados, da corrente. Todos aqueles, sem exceção, que são “chamados” também são, sem exceção, “justificados”. A Bíblia é clara.
Aqueles (as pessoas previamente amadas e predestinadas por Deus) que Ele chamou, a estes (somente a estes e todos estes) também justificou. Agora, se as palavras significarem o que elas dizem, então todos que foram “chamados por Deus” devem também ser “justificados por Deus”. Você não pode separar estes dois elos. É impossível encontrar o conceito arminiano de livre-arbítrio dentro do texto. Nós não podemos crer que Deus “chama” (no sentido dado à palavra por Paulo aqui) todos os homens, e então justifica apenas aqueles que desejam responder a este chamado. Uma ideia como esta força o texto a dizer exatamente o oposto do que ele está dizendo. Os seguintes pontos estão explícitos no texto:
- Nosso chamado nasce, ou é causado por nossa predestinação, e não por outro meio.
- Todo aquele que é chamado é seguramente justificado, e todo aquele que é predestinado é seguramente chamado. Aqui, Paulo está falando sobre o Chamado Eficaz de Deus e não o chamado universal.
CINCO: O quinto e último elo da corrente é “glorificação”. Novamente, todos, sem exceção, que foram justificados também são todos, sem exceção, que nos Paraíso serão glorificados definitivamente. É interessante que o Apóstolo usa os verbos no passado. Na mente e propósito dos decretos imutáveis de Deus, todos os cincos atos estão selados e seguros. Nós sempre fomos “glorificados” na mente e no propósito de Deus. Este último ponto ajuda-nos a entender porque este é o único lugar no Novo Testamento em que Paulo pula da justificação para a glorificação, sem mencionar santificação. Paulo não está rejeitando a verdade da necessidade da Perseverança dos Santos, mas no contexto o Apóstolo está lidando com as obras de Deus baseadas em Seus soberanos propósitos da graça eletiva. O poder de Deus irá cumprir tudo que Ele propõe. Santificação é garantida na corrente porque a lei está escrita em todo coração justificado e o Espírito Santo é dado como o novo Mestre para cada chamado. A graça realmente reina em todo crente porque o pecado foi morto e todos os requisitos da lei são cumpridos.
Uma das melhores formas de entender todos os cinco elos de Romanos 8:29-31 e o argumento que Paulo sustenta é observá-lo ao contrário.
(1) “Quem é o homem que será definitivamente glorificado no Paraíso?” R.: Todos aqueles que têm sido justificados pela graça de Deus.
(2) “Quem são aqueles que certamente serão justificados pela graça de Deus?”. R.: Todos aqueles que foram soberanamente e de forma eficaz chamados pelo Espírito Santo através do Evangelho.
(3) “Quem são aqueles que temos a certeza de serem chamados de forma eficaz?” R.: Todos aqueles predestinados por Deus.
(4) “Quem são aqueles que foram predestinados por Deus?” Todos aqueles escolhidos (previamente amados ou pré-conhecidos) pela soberana e eletiva graça de Deus.
Vamos comparar alguns outros versos que falam da “presciência” de Deus e ver o que realmente significa. 1 Pedro 1:1,2 é uma passagem paralela à Romanos 8:29. Fala dos “eleitos” serem escolhidos por Deus “de acordo com a presciência”.
“Pedro, apóstolo de Jesus Cristo, aos peregrinos da Dispersão no Ponto, Galácia, Capadócia, Ásia e Betínia, eleitos segundo a presciência de Deus Pai, na santificação do Espírito, para a obediência e aspersão do sangue de Jesus Cristo: Graça e paz vos sejam multiplicadas.“ (1 Pedro 1:1,2)
Em vários versos seguintes Pedro usa a mesma palavra e nos conta que a morte de Cristo foi “pré-conhecida” por Deus. Em qualquer sentido Deus sabia com certeza que o Cristo viria e morreria na cruz; da mesma forma Deus “conheceu de antemão” que os eleitos seriam salvos. É interessante notar que algumas versões utilizam a palavra “conhecido” enquanto outras traduzem como “escolhido”. O contexto está falando sobre a morte de Cristo:
“o qual [Cristo], na verdade, foi conhecido ainda antes da fundação do mundo…” (1 Pedro 1:20 NVI)
“Ele [Cristo] foi escolhido por Deus antes da criação do mundo…” (1 Pedro 1:20 NTLH)
Seria ridículo dizer que Deus decidiu enviar Cristo ao mundo porque Ele “previu” que Cristo viria ao mundo e morreria. Deus não “escolheu” enviar Cristo porque Ele “previu” que pecadores O condenariam à morte. Deus soberanamente propôs enviar Cristo e o próprio Deus foi o autor da morte de Cristo. No mesmo sentido, Deus soberanamente propôs a salvação individual dos eleitos e somente Ele é o único autor e consumador de nossa salvação individual. Deus preordenou minha salvação exatamente da mesma forma como Ele preordenou a morte de Cristo.
No Pentecostes, Pedro estava explicando o significado e a causa dos eventos daquele dia. Note que Pedro usa a mesma palavra quando se refere à morte de Jesus:
“Este homem lhes foi entregue por propósito determinado e pré-conhecimento de Deus…” (Atos 2:23 NVI)
“a este, que foi entregue pelo determinado conselho e presciência de Deus…” (Atos 2:23 RA)
Era “propósito determinado e pré-conhecimento de Deus” ter Cristo crucificado no mesmo sentido que nós somos “pré-conhecidos” para ser salvos. Nós somos destinados à salvação pelo “determinado conselho e presciência de Deus” no exato sentido de que Cristo foi destinado à cruz. Isto é exatamente o que a Bíblia está dizendo. Nenhuma manipulação pode mudar o significado da Palavra de Deus.
Nós poderíamos demonstrar os mesmos fatos com a nação de Israel. Da mesma forma que Deus “escolheu” a nação de Israel para privilégios especiais, Ele nos escolheu para a salvação pessoal. Quem ousaria sugerir que Deus “escolheu” Israel porque Ele “previu” que eles “desejariam ser escolhidos”? Uma ideia assim é totalmente contrária à toda a Escritura. Se aceitarmos as palavras do Espírito Santo sem tentar distorcê-las para significar algo diferente do que elas realmente dizem, então nós devemos rejeitar a noção arminiana sobre pré-conhecimento quando falamos de nossa eleição para a salvação.
Não estamos sugerindo que presciência não inclui conhecimento de antemão e até pode, em alguns casos, significar isso. Estamos dizendo que nos versos discutidos, a palavra só pode significar preordenação. Esses versos das Escrituras devem ser tomados como um ato de Deus e não apenas a habilidade de ver o futuro. Talvez uma ilustração possa ajudar. Um arquiteto tem perfeito “pré-conhecimento” de todo prédio que ele desenha. Ele “pré-conhece” exatamente quão grande será, quantas janelas e portas terá e todos os outros detalhes. Ele vê o tipo de trancas que será usado, e até mesmo sabe a cor do piso dos andares. Agora, como o arquiteto “pré-conhece” tudo isso com certeza antes ainda do trabalho começar? De acordo com nossos amigos arminianos, o arquiteto tem a habilidade de ver o futuro. Ele “prevê” que engenheiro receberá o trabalho de construir o prédio. O arquiteto também prevê que tipo de janela este engenheiro em particular usará quando forem apresentadas várias opções. Com base neste “pré-conhecimento”, o arquiteto “escolhe” este tipo de janela em seus planos. O mesmo acontece com o resto do prédio. Como a “presciência” do arquiteto inclui tudo no prédio, ele é capaz de incorporar na planta todas as coisas que ele “prevê” que vários engenheiros “escolherão” fazer.
Qualquer ser pensante riria ao ouvir isso e diria: “John, essa ideia é completamente sem sentido”. É claro que é. Entretanto, não é mais sem sentido que a tentativa arminiana de refutar a eleição bíblica ao dizer que Deus nos escolhe porque ele previu que nós creríamos. Todos nós sabemos que o pré-conhecimento do arquiteto de como será um prédio é baseado em seus planos e propósitos. Se nós formos verdadeiramente honestos com as Escrituras, nós saberemos que o pré-conhecimento de Deus sobre quem crerá é inteiramente fundamentado em Seus planos e propósitos e não num conhecimento prévio da vontade do homem.
Uma comparação entre dois versículos da Escritura irá comprovar claramente o que já foi dito. Ambos os versos usam a palavra “escolheu”. No primeiro versículo, Davi “escolhe” algumas pedras e no segundo versículo, Deus “escolhe” algumas pessoas. Aqui estão os dois textos:
“e em seguida [Davi] pegou seu cajado, ESCOLHEU no riacho cinco pedras lisas, colocou-as na bolsa, isto é, no seu alforje de pastor…“ (1 Samuel 17:40)
“Porque Deus nos ESCOLHEU nele antes da criação do mundo, para sermos santos e irrepreensíveis em sua presença.” (Efésios 1:4)
Alguém seria capaz de acreditar que as cinco pedras foram escolhidas por Davi porque elas tinham de alguma forma comunicado a Davi que elas “desejavam ser escolhidas”? É claro que não! Toda pessoa, sem exceção, leria 1 Sm 17:40 e entenderia que Davi, por razões conhecidas somente por ele, escolheu pedras específicas que queria usar. Por que as pessoas não permitem que a palavra “escolheu” tenha o mesmo significado quando se refere a Deus escolhendo pecadores? Nossos corações eram tão duros e mortos quanto as pedras no riacho. Deus soberanamente nos escolheu individualmente de acordo com Seu bom propósito da mesma forma que Davi escolheu estas cinco pedras. Deus não viu um “desejo” em nós como Davi viu um “desejo” naquelas pedras. É impressionante o quanto a Bíblia é clara em ensinar sobre a Eleição se nós simplesmente deixarmos o texto significar o que ele realmente diz.
Revisado por Ewerton B. Tokashiki
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