Tentando pensar e viver como um Reformado: Reflexões de um estrangeiro residente – Parte 20
C. A Reforma como Movimento Religioso e Teológico
“Nos fins da Idade Média pesava na alma do povo uma tenebrosa melancolia”, constata o holandês Huizinga (1872-1945).[1] Os séculos anteriores à Reforma são descritos como período de grande ansiedade.[2]
Lutero (1483-1546) e as suas famosas angústias espirituais, espelhava “a epítome dos medos e das esperanças de sua época”, interpreta George.[3]
Calvino, ainda que não fosse dominado por esse sentimento, refletia uma constatação natural: a fragilidade humana. Sobre os perigos próprios da vida associados à fragilidade humana, relaciona:
Incontáveis são os males que cercam a vida humana, males que outras tantas mortes ameaçam. Para que não saiamos fora de nós mesmos: como seja o corpo receptáculo de mil enfermidades e dentro de si, na verdade, contenha inclusas e fomente as causas das doenças, o homem não pode a si próprio mover sem que leve consigo muitas formas de sua própria destruição e, de certo modo, a vida arraste entrelaçada com a morte.
Que outra cousa, pois hajas de dizer, quando nem se esfria, nem sua, sem perigo? Agora, para onde quer que te voltes, as cousas todas que a teu derredor estão não somente não se mostram dignas de confiança, mas até se afiguram abertamente ameaçadoras e parecem intentar morte pronta. Embarca em um navio: um passo distas da morte. Monta um cavalo: no tropeçar de uma pata a tua vida periclita. Anda pelas ruas de uma cidade: quantas são as telhas nos telhados, a tantos perigos estás exposto. Se um instrumento cortante está em tua mão ou de um amigo, manifesto é o detrimento. A quantos animais ferozes vês, armados estão-te à destruição. Ou que te procures encerrar em bem cercado jardim, onde nada senão amenidade se mostre, aí não raro se esconderá uma serpente. Tua casa, a incêndio constantemente sujeita, ameaça-te pobreza durante o dia, durante a noite até mesmo sufocação. A tua terra de plantio, como esteja exposta ao granizo, à geada, à seca e a outros flagelos, esterilidade te anuncia e, dela a resultar, a fome. Deixo de referir envenenamentos, emboscadas, assaltos, a violência manifesta, dos quais parte nos assedia em casa, parte nos acompanha ao largo.
Em meio a estas dificuldades, não se deve o homem, porventura, sentir assaz miserável, como quem na vida apenas semivivo, sustenha debilmente o sôfrego e lânguido alento, não menos que se tivesse uma espada perpetuamente a impender-lhe sobre o pescoço?[4]
Não há parte de nossa vida que não se apresse velozmente para a morte.[5]
E o que mais somos nós senão um espelho da morte?[6]
Pascal (1623-1662), mais tarde, constataria que “Só o homem é miserável”[7] e, ao mesmo tempo, grande, porque “ele se conhece miserável”.[8]
No entanto, Calvino não termina seu argumento numa descrição “existencialista” da vida, mas na certeza própria de um coração dominado pela Palavra de Deus. Assim, ele conclui falando da “incalculável felicidade da mente piedosa”:[9]
Quando, porém, essa luz da Divina Providência uma vez dealbou ao homem piedoso, já não só está aliviado e libertado da extrema ansiedade e do temor de que era antes oprimido, mas ainda de toda preocupação. Pois assim como, com razão, se arrepia de pavor da sorte, também assim ousa entregar-se a Deus com plena segurança.[10]
Calvino admite que para qualquer lado que olharmos encontraremos sempre desespero, até que tornemos para Deus, em quem encontramos estabilidade no meio de um mundo que se corrompe.[11]
A Reforma Protestante do século XVI, foi um movimento eminentemente religioso[12] e teológico[13] (pelo menos em sua origem);[14] estando ligada à insatisfação espiritual de dezenas de pessoas – que certamente expressavam o sentimento de milhares de outras anônimas – que ao longo dos séculos não encontravam na igreja romana espaço para a manifestação de sua fé, nem alimento para as suas necessidades espirituais. As insatisfações não visam criar uma nova igreja, mas tornar a existente mais bíblica.
Portanto, a Reforma deve ser vista não como um movimento externo, mas como um movimento interno por parte de “católicos” piedosos[15] – que, diga-se de passagem, ao longo dos séculos tinham manifestado a sua insatisfação, quer por meio do misticismo,[16] quer por meio de uma proposta mais ousada – que desejavam reformar a sua Igreja, revitalizando-a, transformando-a na Igreja dos fiéis.
Todavia, não podemos nos esquecer de que as mudanças causadas pelo Renascimento e Humanismo contribuíram para ela. Afinal, a Reforma ocorreu na história, dentro das categorias tempo e espaço onde o homem está inserido. Isto não diminui as causas e muito menos o valor intrínseco dela, pelo contrário, vem apenas demonstrar o que a Palavra de Deus ensina e no que creram os reformadores: Deus é o Senhor da história. De fato, o que é a história, senão o palco onde Deus efetiva o seu Reino?! “A chave da história do mundo é o Reino de Deus”, interpreta Lloyd-Jones.[17]
Toda a relação “natural-histórico” não é casual nem cegamente determinada. É dirigida por Deus, o Senhor da História.[18] O propósito de Deus na história como realidade presente, faz parte da essência de nossa fé.[19]
A Reforma Protestante do século XVI foi um movimento espiritual com ramificações em todas as áreas da vida, sendo um grande elemento fomentador da vida intelectual e[20] modelador de uma nova ética fundamentada nas Escrituras.[21]
Um ingrediente importante para a nossa compreensão é entender o papel destacado da igreja na vida social e, também, no senso de pertencimento dos fiéis. A igreja romana, para o bem ou para mal estava associada à imaginação medieval como mãe agregadora e identificadora dos crentes. Um elemento que contribuía fortemente para isso, era o confessionário.
A igreja, o confessionário e o senso de pertencimento identificante
Apesar de todas querelas e corrupções eclesiásticas, havia um elemento ideologicamente agregador entre os indivíduos: a Igreja. O consolo buscado quer nessa vida, quer no porvir, passava, necessariamente pela igreja, a “comunidade dos santos” e “seus ministros autorizados”.[22]
A igreja mesmo em suas contradições latentes e patentes, tentava transmitir aos indivíduos a ideia do seu amor incondicional. Este “amor”, de forma declarativa, mas não real, ela dizia oferecer a “todos” os seus filhos, por meio da possibilidade de se adquirir a sua salvação mediante as penitências, ou mesmo, da compra de indulgências,[23] que tinham o poder de perdoar, salvar ou, na pior das hipóteses, abrandar as penalidades do Purgatório.[24] O Confessionário, além de fonte de renda, se tornou um elemento importante de controle,[25] dominação e fortalecimento do poder do papa e do clero. Por outro lado, o Confessionário se constituiu num instrumento de grande importância na aproximação da Igreja, santa e julgadora[26] com os seus filhos pecadores e, o meio – ainda que nem sempre eficaz[27] –, mais poderoso para exercer a disciplina na igreja.[28]
Por intermédio da confissão, os fiéis sentiam-se muitas vezes identificados com a Igreja e consequentemente mais bem socializados.[29] Concomitantemente, usufruíam em algumas circunstâncias, do “alívio” da declaração de seu perdão. Neste caso, o conforto do fiel estava em pertencer à Igreja, sentir-se amparado e perdoado por ela, fazendo parte do seu corpo.
Nesse sentido, Erasmo (1466-1536), conforme citação feita, declara: “Por certo são numerosos e fortes os argumentos contra a instituição da confissão pelo próprio Senhor. Mas como negar a segurança em que se encontra aquele que se confessou a um padre qualificado?”.[30]
Desse modo, mexer com a igreja afetava profundamente o senso de identidade e de localização nesse mundo para o qual, a igreja parecia para muitos ser a única instituição universal.
Portanto, a Reforma traz pelo menos um incômodo em uma sociedade tão bem estabelecida e organizada, a despeito de suas nuances e contradições cada vez mais gritantes e, como vimos, a incapacidade de responder a anseios espirituais de seus seguidores.
McGrath comenta:
O impacto social, cultural e intelectual da Reforma protestante só pode ser totalmente apreendido por meio da avaliação do lugar ocupado pela igreja na Europa do final do período medieval. A igreja era um importante participante na política internacional e nos assuntos internos das regiões e estimulava um sentido de identidade na esfera das comunidades locais. Além de fornecer aos indivíduos um senso de localização e de propósito no panorama abrangente das coisas.[31]
Reforma e avivamento
Valendo-nos das categorias de Schaeffer, podemos dizer que na Reforma tivemos um reavivamento: “Reforma refere-se a uma restauração à doutrina pura; reavivamento refere-se a uma restauração na vida do cristão. Reforma fala de um retorno aos ensinos da Bíblia; reavivamento fala de uma vida levada à sua relação apropriada com o Espírito Santo”.[32] O reavivamento completa a reforma e ambos se completam: “Não pode haver reavivamento verdadeiro a menos que tenha havido reforma; e a reforma não é completa sem reavivamento”.[33]
A Reforma e a oração
A Reforma foi também um movimento marcado pela ênfase na oração. Barth, estudando a oração nos Catecismos da Reforma, faz um resumo pertinente:
A Reforma se nos apresenta como um grande conjunto: um grande labor que compreende pesquisas, pensamento, pregação, discussão, polêmica, e organização. Porém, foi mais que tudo isso. Pelo que sabemos, foi também um constante ato de oração, uma invocação e, acrescentemos, uma ação dos homens, de certos homens, ao mesmo tempo que uma resposta da parte de Deus.[34]
Nas 95 teses afixadas por Lutero na Catedral de Wittenberg, lemos na tese 48: “Deve-se ensinar aos cristãos que, se o papa precisa conceder mais indulgências, mais necessita de uma oração fervorosa do que de dinheiro”. A Igreja, portanto, a começar de seu principal líder, precisava da prática fervorosa da oração. A oração sempre deve vir acompanhada da obediência.[35]
O Espírito é o Mestre da oração. A oração é um algo difícil e misterioso. Difícil porque somos fadados a nos dispersar em digressões e devaneios enquanto oramos. Podemos banalizar esse grandioso privilégio com palavrórios inúteis e vazios (Mt 6.5-8).[36] Misterioso porque o Senhor da glória, o Deus santo e majestoso, estabeleceu esse meio de relacionamento conosco e nos ouve com atenção e amor.
A oração, conforme os preceitos bíblicos, está relacionada com a Providência de Deus. Se por um lado, nós não podemos delimitar a ação de Deus às nossas orações, por outro, devemos estar atentos ao fato de que Deus nos abriu a porta da oração a fim de exercitarmos a nossa fé em paciente submissão.
Deus que ordenou os fins, também estabeleceu os meios necessários. Portanto, ambos são inseparáveis.[37] Em muitos casos, ainda que não possamos precisar todos os meios, sabemos que as nossas orações se constituem em meios estabelecidos por Deus dentro da execução de seus propósitos (Jo 16.24; Tg 4.2).
Entendemos que as nossas orações quando feitas por um motivo justo, por meio de Cristo e, partindo de um coração sincero, fazem parte da execução do plano de Deus. “Quando Deus nos dá aquilo que pedimos, é como se essas coisas tivessem nelas a estampa de nossas orações!”, conclui Flavel (c.1627–1691).[38]
Insisto: A concepção da Reforma como um movimento originariamente religioso não implica na compreensão de que ela esteve restrita a apenas esta esfera da realidade, pelo contrário, entendemos que a Reforma foi um movimento de grande alcance cultural,[39] institucional, social e político na história da Europa[40] e, posteriormente, em todo o Ocidente.
A amplitude da influência da Reforma em diversos setores da vida estava implícita em sua própria constituição: era impossível alguém abraçar a Reforma apenas no campo da religião e continuar em tudo o mais a ser um homem de uma ética medieval, com a sua perspectiva da realidade e prática intocáveis.
A Reforma em sua própria constituição era extremamente revolucionária: “A Reforma ocupou, e deve continuar a ocupar, um legítimo e significativo lugar na história das ideias”.[41]
Reconhecendo o aspecto religioso como força motriz da Reforma e de sua influência continua McGrath: “A relevância história da Reforma não é apenas inseparável das visões religiosas dos principais reformadores, mas também, em grande parte, consequência das mesmas”.[42]
Não deixa de ser significativo o testemunho de dois estudiosos católicos, Abbagnano (1901-1990) e Visalberghi (1919-2007), quando afirmam que, “contribuição fundamental à formação da mentalidade moderna foi a reforma religiosa de Lutero e Calvino”.[43]
Rev. Hermisten Maia Pereira da Costa
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[1] Johan Huizinga, O Declínio da Idade Média, São Paulo: Verbo; EDUSP., 1978, p. 31.
[2] Veja-se: Johan Huizinga, O Declínio da Idade Média, passim. Tillich denomina a ansiedade predominante nos fins da Idade Média de “ansiedade moral” e “ansiedades da culpa e da condenação” (Paul Tillich, A Coragem de Ser, 3. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1976, p. 44 e 45). Ver também: Paul Tillich, A Coragem de Ser, 44ss.; Paul Tillich, História do Pensamento Cristão, p. 210ss.; Rollo May, O Significado de Ansiedade, Rio de Janeiro: Zahar, 1980, p. 175ss.; Timothy George, A Teologia dos reformadores, p. 25ss.; Jean Delumeau, História do Medo no Ocidente: 1300-1800, uma cidade sitiada, 2. reimpressão, São Paulo: Companhia das Letras, 1993, passim.
[3] Timothy George, A Teologia dos reformadores, p. 26. Quanto aos sermões que Lutero deve ter ouvido enquanto estudante, que favoreciam o sentimento de culpa, veja-se: Timothy George, Lendo as Escrituras com os reformadores, São Paulo: Cultura Cristã, 2015, p. 183-184.
[4] João Calvino, As Institutas, I.17.10. Em outro lugar:
“Se considerarmos a enorme quantidade de acidentes aos quais estamos sujeitos, veremos o quão necessários é exercitarmos nossa mente desta maneira.
“Enfermidades de todos os tipos tocam nossos débeis corpos, uma atrás da outra: ou a pestilência nos enclausura, ou os desastres da guerra nos atormentam.
“Em outra ocasião, as geadas e os granizos destroem nossas colheitas, e ainda somos ameaçados pela escassez e a pobreza.
“Em vista destes acontecimentos, as pessoas maldizem suas vidas, e até o dia em que nasceram; culpam o sol e às estrelas, e ainda censuram e blasfemam a Deus, como se Ele fora cruel e injusto” (João Calvino, A Verdadeira Vida Cristã, São Paulo: Novo Século, 2000, p. 43).
[5] João Calvino, O Livro dos Salmos, São Paulo: Parakletos, 2002, v. 3, (Sl. 102.25), p. 585.
[6] João Calvino, O Livro dos Salmos, v. 3, (Sl 102.26), p. 586.
[7] Blaise Pascal, Pensamentos, São Paulo: Abril Cultural, (Os Pensadores, v. 16), 1973, VI.399. p. 136.
[8] Blaise Pascal, Pensamentos, VI.397. p. 136. “O homem não passa de um caniço, o mais fraco da natureza, mas é um caniço pensante. Não é preciso que o universo inteiro se arme para esmagá-lo: um vapor, uma gota de água, bastam para matá-lo. Mas, mesmo que o universo o esmagasse, o homem seria ainda mais nobre do que quem o mata, porque sabe que morre e a vantagem que o universo tem sobre ele; o universo desconhece tudo isso” (Blaise Pascal, Pensamentos, VI.347. p. 127-128).
[9] João Calvino, As Institutas, I.17.10.
[10]João Calvino, As Institutas, I.17.11. “…. o homem crente e fiel é levado a contemplar, mesmo nessas coisas, a clemência de Deus e Sua bondade paternal. E assim, ainda que se sinta consternado pela morte de todos os que lhe são chegados e veja sua casa deserta, não deixará de bendizer a Deus. Antes se dedicará a meditar: Visto que a graça de Deus habita em sua casa, não a deixará triste e vazia; ainda que as suas vinhas e suas lavouras sejam destruídas pela geada, pela saraiva ou por qualquer outro tipo de tempestade, prevendo-se por isso o perigo de fome, ainda assim ele não perderá o ânimo e não ficará descontente com Deus. Em vez disso, persistirá em sua firme confiança, dizendo em seu coração: Apesar disso tudo, estamos sob a proteção de Deus, somos ‘ovelhas de sua mão’ e ‘rebanho do seu pastoreio’. Por mais grave que seja a improdutividade da terra, Ele sempre nos dará o sustento. Mesmo que o crente padeça enfermidade, não se deixará abater pela dor nem se deixará arrastar pela impaciência e queixar-se de Deus. Ao contrário, considerando a justiça e a bondade do Pai celestial nos castigos que nos ministra, o crente fiel se deixará dominar pela paciência” (João Calvino, As Institutas da Religião Cristã: edição especial com notas para estudo e pesquisa, São Paulo: Cultura Cristã, 2006, (IV.17), p. 195-196).
[11] João Calvino, O Livro dos Salmos, v. 3, (Sl. 102.26), p. 586. Para uma visão panorâmica comparativa entre Maquiavel e Calvino concernente ao conceito de Fortuna e Providência, veja-se: https://cpaj.mackenzie.br/fileadmin/user_upload/3-A-fortuna-e-a-provid%C3%AAncia-Maquiavel-e-Calvino-dois-olhares-sobre-a-hist%C3%B3ria-e-a-vida-Hermisten-Maia-Pereira-da-Costa.pdf (Consulta feita em 22.09.2023).
[12] Vejam-se: André Biéler, O Pensamento Econômico e Social de Calvino, São Paulo: Casa Editora Presbiteriana, 1990, p. 43, 67; André Biéler, A Força Oculta dos Protestantes, São Paulo: Editora Cultura Cristã, 1999, p. 49-51; David S. Schaff, Nossa Crença e a de Nossos Pais, 2. ed. São Paulo: Imprensa Metodista, 1964, p. 66; Felipe Fernández-Armesto; Derek Wilson, Reforma: O Cristianismo e o Mundo 1500-2000, Rio de Janeiro: Record, 1997, p. 11; Timothy George, Teologia dos reformadores, p. 20. De modo especial a respeito do Calvinismo, veja-se: Philip Benedict, Christ’s Churches Purely Reformed: A Social History of Calvinism, New Haven: Yale University Press, 2002, p. 543. O filósofo católico Battista Mondin (1926-2015), disse: “A Reforma protestante foi um acontecimento essencialmente religioso, mas causou ao mesmo tempo profundas transformações políticas, sociais, econômicas e culturais” (B. Mondin, Curso de Filosofia, São Paulo: Paulinas, 1981, v. 2, p. 27). Em outro lugar reafirma: “Como dissemos no início do capítulo, a Reforma protestante foi antes e acima de tudo um acontecimento religioso. Em consequência disso, ela deve ser estudada e julgada segundo critérios religiosos, mais precisamente, segundo os critérios da fé cristã, cujo espírito original a Reforma se propunha restabelecer” (B. Mondin, Curso de Filosofia, v. 2, p. 41). O antigo professor de História Eclesiástica da Universidade de Yale, Roland H. Bainton (1894-1984), diz que “A Reforma foi acima de tudo um reavivamento da religião” (Roland H. Bainton, The Reformation of the Sixteenth Century, Boston, Massachusetts: Beacon Press, 1985 (Enlarged Editon), p. 3). Ver também: Fernand Braudel, Gramática das Civilizações, 3. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2004, p. 324). É pertinente a observação de McGrath, quanto ao equilíbrio necessário neste ponto. Veja-se: Alister E. McGrath, A Revolução Protestante, Brasília, DF.: Editora Palavra, 2012, p. 15-16.
[13]Partilho da ideia de Tom Nettles, de que “Tentativas de Reforma por meio do tratamento de dimensões morais, espirituais e eclesiológicas, ignorando a teológica, sempre falharam” (Tom Nettles, Um Caminho Melhor: Crescimento de Igreja por meio de reavivamento e reforma: In: Michael Horton, ed. Religião de Poder, São Paulo: Editora Cultura Cristã, 1998, p. 134).
[14]Veja-se: A. Biéler, O Pensamento Econômico e Social de Calvino, p. 47-48; André Biéler, A Força Oculta dos Protestantes, p. 50-51.
[15] Vejam-se: Émile G. Léonard, O Protestantismo Brasileiro, 2. ed. Rio de Janeiro; São Paulo: JUERP.; ASTE., 1981, p. 27-28; Felipe Fernández-Armesto; Derek Wilson, Reforma: O Cristianismo e o Mundo 1500-2000, p. 10-11.
[16] Lutero por exemplo, foi grandemente influenciado por Agostinho (354-430), Mestre Eckhart (c. 1260- c.1327) (Vejam-se: Paul Tillich, História do Pensamento Cristão, p. 188; Heiko A. Oberman, The Reformation: Roots & Ramifications, Grand Rapids, Michigan: Eerdmans, 1994, p. 77ss), Johannes Tauler (c. 1300-1361) – a quem se refere com grande apreço – (Vejam-se: Obras Selecionadas de Martinho Lutero, São Leopodo, RS.; Porto Alegre, RS.: Sinodal; Concórdia, 1987, v. 1, p. 98; Ph. J. Spener, Mudança para o Futuro: Pia Desideria, Curitiba, PR.; São Bernardo do Campo, SP.: Encontrão Editora; Instituto Ecumênico de Pós-Graduação em Ciências da Religião, 1996, p. 112ss.) e Johannes von Staupitz (c. 1465-1524), este, que antes da Reforma, era seu mestre, amigo e incentivador (Veja-se: Philip Schaff, History of the Christian Church, v. 8, p. 259).
[17] D. Martyn Lloyd-Jones, Do Temor à Fé, Miami: Editora Vida, 1985, p. 23. “As nações podem levantar-se e cair, todavia o plano de Deus prossegue, firme e sem interrupção” (D. Martyn Lloyd-Jones, As Insondáveis Riquezas de Cristo, São Paulo: Publicações Evangélicas Selecionadas, 1992, p. 69-70).
[18]Veja-se: Benjamin Wirt Farley, A Providência de Deus na Perspectiva Reformada: In: Donald K. Mckim, ed. Grandes Temas da Tradição Reformada, São Paulo: Pendão Real, 1999, p. 74.
[19] Veja-se A.A. Hoekema, A Bíblia e o Futuro, São Paulo: Casa Editora Presbiteriana, 1989, p. 39ss. “O Reino de Deus é no Novo Testamento, a vida e a meta do mundo que correspondem às intenções do Criador” (Karl Barth, La Oración, Buenos Aires: La Aurora, 1968, p. 51).
[20] “A Reforma ocupou, e deve continuar a ocupar, um legítimo e significativo lugar na história das ideias” (Alister E. McGrath, The Intellectual Origins of The European Reformation, Cambridge, Massachusetts: Blackwell Publishers, 1995 (reprinted), p. 4). “Além de promover a pregação clara do evangelho, a Reforma moldou a sociedade como um todo, inclusive o governo, a cosmovisão das pessoas e a cultura em todas as suas manifestações” (Francis A. Schaeffer, O Grande Desastre Evangélico. In: Francis A. Schaeffer, A Igreja no Século 21, São Paulo: Cultura Cristã, 2010, p. 251).
[21] “Desde o princípio, a Reforma foi um movimento tanto religioso quanto ético” (Herman Bavinck, Dogmática Reformada, São Paulo: Cultura Cristã, 2012, v. 4, p. 180). “A Reforma Protestante não apenas buscou purificar a igreja e livrá-la dos erros doutrinários, como também buscou a restauração da integralidade da vida. Isso acarretou a libertação da vida natural do homem e das várias esferas na sociedade do senhorio excessivo da igreja. Enquanto o Humanismo foi uma tentativa de proclamar a liberdade do homem em relação a Deus e a toda autoridade, reforçando a autonomia contra a heteronomia, os reformadores se uniram em sua paixão pela liberdade do homem cristão, o que significava a subserviência à Palavra do Senhor” (Henry R. Van Til, O conceito calvinista de cultura, São Paulo: Cultura Cristã, 2010, p. 20).
[22] Veja-se: Alister E. McGrath, A Revolução Protestante, Brasília, DF.: Editora Palavra, 2012, p. 27.
[23] A prática das “Indulgências” é bem antiga na Igreja romana; ninguém sabe ao certo quando teve o seu início. Há quem sugira que começou com os papas Pascoal I (817-824) e João VIII (872-882). (Cf. H.H. Halley, Manual Bíblico, 2. ed. São Paulo: Vida Nova, 1971, p. 698); outros, encontram o seu fundamento histórico em Cipriano, bispo de Cartago (248-258) (Epístolas, XVI, XXI, XXII, In: The Ante-Nicene Fathers, Alexander Roberts; James Donaldson, Buffalo, The Christian Literature Company, 1886, v. V, p. 296, 299-301). (Cf. Paul F. Palmer, Indulgence: In: Encyclopaedia Britannica, v. 12, (1962), p. 281); outros ainda, pensam que se originou no sul da França, por volta de 1016 (Cf. W. Walker, História da Igreja Cristã, São Paulo: ASTE., 1967, v. 1, p. 349). Schaff, diz que “até cerca de 1150, a estrutura sacramental (da indulgência) não estava completamente desenvolvida” (D.S. Schaff, Nossa Crença e a de Nossos Pais, 2. ed. São Paulo: Imprensa Metodista, 1964, p. 329). Seja como for, o certo é que com o passar dos anos esta prática foi sendo ampliada, e o perdão concedido, foi se tornando cada vez mais exaustivo. Este personagem; o vendedor de indulgências e a sua avareza eram bem conhecidos na Idade Média (Veja-se “O prólogo do vendedor de indulgências”, in: Os Guinness, Sete Pecados Capitais, São Paulo: Shedd Publicações, 2006, p. 173-176). Em novembro de 1095, pela primeira vez, foi prometida a indulgência plenária, pelo papa Urbano II (1088-1099), no Sínodo de Clermont na França, a todos aqueles que participassem por pura devoção da Primeira Cruzada em Jerusalém. (Council of Clermont, Mansi, Concilia, xx, 816). Tornando-se a partir daí esta prática comum. (Vejam-se: Loraine Boettner, Catolicismo Romano, São Paulo: Imprensa Batista Regular, 1985, p. 14, 213-215; Paul F. Palmer, Indulgence: In: Encyclopaedia Britannica, v. 12, (1962), p. 281; K.S. Latourette, Historia del Cristianismo, v. 1, p. 491, 624-625; Donald G. Davis, Indulgencia: In: Everett F. Harrison, ed. Diccionario de Teologia, Grand Rapids, Michigan: T.E.L.L., 1985, p. 281; W. Walker, História da Igreja Cristã, I, p. 349). Este sínodo realizado ao ar livre, teve um apelo entusiástico do papa: “Cristãos da Europa, uni-vos! Tomai da cruz e da espada, e ide reconquistar a Terra Santa, que se acha nas mãos dos turcos e maometanos”. (Cf. Vamberto Morais, Pequena História do Anti-Semitismo, São Paulo: Difusão Europeia do Livro, 1972, p. 168-169). Os judeus odiaram tanto este concílio que substituíram o nome de Clermont (Monte Claro), por Har Ophel (Monte das Trevas).
[24] Curiosamente, Platão (427-347 a.C.), um filósofo pagão, com discernimento correto, entendia que um dos males de sua época era a corrosão da religião praticada por supostos sacerdotes e profetas – que ele chama de mendigos e adivinhos –, os quais exploravam a credulidade das pessoas, especialmente das ricas. Dentro do quadro descrito, uma das fórmulas usadas por esses líderes religiosos, era fazer as pessoas crerem que poderiam mudar a vontade dos deuses mediante a oferta de sacrifícios ou, através de determinados encantamentos; os deuses seriam portanto limitados e aéticos, sem padrão de moral, sendo guiados pelas seduções humanas:
“Mendigos e adivinhos vão às portas dos ricos tentar persuadi-los de que têm o poder, outorgado pelos deuses devido a sacrifícios e encantamentos, de curar por meio de prazeres e festas, com sacrifícios, qualquer crime cometido pelo próprio ou pelos seus antepassados, e, por outro lado, se se quiser fazer mal a um inimigo, mediante pequena despesa, prejudicarão com igual facilidade justo e injusto, persuadindo os deuses a serem seus servidores – dizem eles – graças a tais ou quais inovações e feitiçarias. Para todas estas pretensões, invocam os deuses como testemunhas, uns sobre o vício, garantindo facilidades (…). Outros, para mostrar como os deuses são influenciados pelos homens, invocam o testemunho de Homero, pois também ele disse: ‘Flexíveis até os deuses o são. Com as suas preces, por meio de sacrifícios, votos aprazíveis, libações, gordura de vítimas, os homens tornam-nos propícios, quando algum saiu do seu caminho e errou’ (Ilíada IX.497-501)” (Platão, A República, 7. ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, (1993), 364c-e).
[25] Ver: Peter Burke, Os usos da alfabetização no início da Itália Moderna: In: Peter Burke; Roy Porter, orgs. História Social da Linguagem, p. 30.
[26]O Código do Direito Canônico, (1983) Cânon 978, § 1, diz: “Lembre-se o sacerdote que, ao ouvir confissões, desempenha simultaneamente o papel de juiz e de médico…”
[27] Vejam-se: Jacques Le Goff, Mercadores e Banqueiros da Idade Média, São Paulo: Martins Fontes, 1991, p. 78ss.
[28] Bengt Hägglund, História da Teologia, Porto Alegre, RS.: Casa Publicadora Concórdia, 1973, p. 136.
[29] Eduardo Hoornaert, et. al., observa que, “Estudos recentes acerca da inquisição em Portugal e no Brasil demonstram como a religião católica era decisiva e definitiva em relação à integração de uma pessoa na sociedade colonial brasileira, sobretudo no tocante aos assim chamados ‘cristãos-novos’, ou judeus forçosamente convertidos ao catolicismo” (Eduardo Hoornaert, et. al., História da Igreja no Brasil: Ensaio de interpretação a partir do povo, São Paulo: Petrópolis, RJ.: Paulinas; Vozes, 1983, (História Geral da Igreja na América Latina, II/1), p. 309-310). Noutro contexto, analisando o romantismo de Friedrich Schlegel (1772-1829), “o mais refinado representante crítico da ironia(*) romântica”, Tillich observa que “São muitas as pessoas que depois de experimentar a falta de sentido na vida e a perda de conteúdos normativos, obrigatórios e produtores da comunidade, etc., ingressam na igreja católica romana na busca da mãe protetora e aconchegante” (Paul Tillich, Perspectivas da Teologia Protestante nos Séculos XIX e XX, São Paulo: ASTE., 1986, p. 100).
(*) Tillich define “ironia” como significando “que o infinito é superior a qualquer coisa finita e leva a outros tipos de concreção finita” (Paul Tillich, Perspectivas da Teologia Protestante nos Séculos XIX e XX, p. 99).
[30] Erasmo, Opera Omnia, Leyde, 1704, v, col. 145-6, Apud Jean Delumeau, A Confissão e o Perdão: As Dificuldades da Confissão nos Séculos XIII a XVIII, São Paulo: Companhia das Letras, 1991, p. 37. Em outro lugar, também indagou: “Por que se dar ao trabalho de confessar seus pecados a outro ser humano apenas pelo fato de ser um sacerdote, quando pode confessá-los diretamente a Deus?” (Apud Alister E. McGrath, Teologia, sistemática, histórica e filosófica: uma introdução à teologia cristã, São Paulo: Shedd Publicações, 2005, p. 84). No Brasil colonial, a confissão – que adquiriu um status “tão fundamental e central como o do batismo” –, foi tão bem incorporada na mentalidade do povo, que os bandeirantes, por exemplo, nunca dispensavam os seus capelães para confessarem-se nos seus momentos de angústia. (Cf. Eduardo Hoornaert, et. al., História da Igreja no Brasil: Ensaio de interpretação a partir do povo, São Paulo: Petrópolis, RJ.: Paulinas; Vozes, 1983, (História Geral da Igreja na América Latina, II/1), p. 307, 310).
[31]Alister E. McGrath, A Revolução Protestante, Brasília, DF.: Editora Palavra, 2012, p. 24.
[32]Francis A. Schaeffer, Morte na Cidade, São Paulo: Cultura Cristã, 2003, p. 12.
[33]Francis A. Schaeffer, Morte na Cidade, São Paulo: Cultura Cristã, 2003, p. 12. “A igreja em nossa geração precisa de reforma, reavivamento e revolução construtiva” (Francis A. Schaeffer, Morte na Cidade, p. 11).
[34]Karl Barth, La Oración, Buenos Aires: La Aurora, 1968, p. 9.
[35] Veja-se: Martinho Lutero, Catecismo Maior: In: Os Catecismos, São Leopoldo, RS.; Porto Alegre: Concórdia; Sinodal, 1983, p. 457ss.
[36] Veja-se: Hermisten M.P. Costa, O Pai Nosso: A Oração do Senhor, São Paulo: Cultura Cristã, 2001, p. 25-28.
[37] Veja-se: Paul Helm, A Providência de Deus, São Paulo: Cultura Cristã, 2007, p. 196-197.
[38]John Flavel, Se Deus Quiser, São Paulo: Publicações Evangélicas Selecionadas, 1987, p. 26.
[39] Veja-se: Alain Peyrefitte, A Sociedade de Confiança: Ensaio sobre as origens e a natureza do desenvolvimento, Rio de Janeiro: Topbooks, 1999.
[40]Aliás, este é o pressuposto fundamental do jovem brilhante estudioso, Alister McGrath. (Veja-se: Alister E. McGrath, The Intellectual Origins of The European Reformation, p. 4).
[41]Alister E. McGrath, The Intellectual Origins of The European Reformation, p. 4.
[42]Alister McGrath, Origens Intelectuais da Reforma, São Paulo: Cultura Cristã, 2007, p. 13.
[43] N. Abbagnano; A. Visalberghi, Historia de la Pedagogía, Novena reimpresión, México: Fondo de Cultura Económica, 1990, p. 253.
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